sexta-feira, 31 de agosto de 2007

ACIDENTES POR ÁGUAS-VIVAS E CARAVELAS NA COSTA ATLÂNTICA DA AMÉRICA.



Por: Dr. Vidal Haddad Júnior
Faculdade de Medicina de Botucatu
Universidade Estadual Paulista
Instituto Butantan

Cnidários são animais com tentáculos portadores de organelas microscópicas chamadas nematocistos. Estes disparam por contato e por osmose, injetando peçonha de ação neurotóxica e dermatonecrótica. Os cnidários causam cerca de 25% dos acidentes por animais marinhos no Brasil1,2,3,4,5,6. O quadro clínico é típico, com aparecimento de placas lineares eritêmato-edematosas e intensa sintomatologia dolorosa, imediatamente após o contato. Raramente, podem surgir dispnéia, mal estar, hipotensão arterial e arritmias cardíacas 1,2,3,4,5.

As classes de cnidários ligadas a acidentes em humanos são: Anthozoa (anêmonas e corais), Hidrozoa (caravelas e hidróides – Figura 1), Scyphozoa (as medusas ou águas-vivas verdadeiras ) e Cubozoa (as cubomedusas, responsáveis pelos acidentes mais graves em seres humanos. Existe controvérsia no tratamento de acidentes por cnidários: em todos os acidentes deve-se se usar as compressas de água do mar gelada ou cold packs com proteção de um tecido fino, para que a água doce não atinja o local acidentado. Essa medida tem potente efeito analgésico e sempre deve ser aplicada ainda na praia, como rotina de primeiros socorros (FENNER, 1997). Quando o animal envolvido for uma cubomedusa (Tamoya haplonema ou Chiropsalmus quadrumanus) é fundamental a aplicação de vinagre para inativação de nematocistos ainda íntegros na superfície cutânea ou nos tentáculos não retirados. Nas caravelas (Physalia physalis) e nos acidentes por Olindias sambaquiensis a orientação não é tão segura, uma vez que experimentos in vitro mostram que os nematocistos de alguns exemplares de caravelas dispararam quando colocados com soluções de vinagre ou álcool. Em nossa experiência clínica, no entanto, a medida se mostrou benéfica para qualquer acidente causado por cnidário da costa brasileira 1,2,3,4,5.

Outras medidas locais feitas no momento do acidente, tais como o uso de anti-histamínicos, urina, corticóides, álcool ou Coca-Cola não tem apoio científico e não devem ser aplicadas, sob pena de agravamento do quadro, que, no mínimo, permanecerá sem tratamento correto. Os quadros com fenômenos sistêmicos (hipotensão arterial, arritmias cardíacas, edema agudo de pulmão) devem ser encaminhados com urgência para um hospital, providência que pode ser útil também no caso da dor persistir após as medidas de primeiros socorros (nestes casos, uma ampola via intramuscular de dipirona parece ser capaz de controlar o quadro doloroso). Arritmias cardíacas devem ser tratadas com uso de Verapamil via endovenosa.
As compressas de água do mar gelada tem potente efeito analgésico e devem ser usadas nos primeiros socorros. Banhos de vinagre também são úteis. Os quadros sistêmicos devem ter atendimento hospitalar, assim como dor local persistente.


BIBLIOGRAFIA

1. Haddad Jr V. Atlas de animais aquáticos perigosos do Brasil: guia médico de identificação e tratamento. São Paulo, Editora Roca, 2000.

2. Haddad Jr, V; Cardoso, JLC; Silveira, FLS. Seabather's eruption: report of five cases in the Southeast Region of Brazil. Rev Inst Med trop S Paulo 43(3): 171-172, 2001.

3. Haddad Jr V, Silveira FL, Cardoso JLC, Morandini AC. A report of 49 cases of cnidarian envenoming from southeastern Brazilian coastal waters. Toxicon 40(10): 1445-1450, 2002.

4. Haddad Jr V, Silva G, Rodrigues TC, Souza V. Injuries with high percentage of systemic findings caused by the cubomedusa Chiropsamus quadrumanus (Cnidaria) in Southeast region of Brazil: report of ten cases. Revista da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical, 36 (1): 84-85, 2003.

5. Haddad Jr, V. Animais aquáticos de importância médica. Revista da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical 36(5): 591-597, 2003.

6. Cardoso JLC, França FOS, Wen FH, Malaque CMS, Haddad Jr V. Animais venenosos no Brasil: biologia, clínica e terapêutica dos acidentes. São Paulo, Editora Sarvier, 2004.

Correspondência:

Vidal Haddad Junior
e-mail:
haddadjr@fmb.unesp.br

Nenhum comentário: